terça-feira, 29 de março de 2016

Facções comandam presídios e produzem suas próprias leis, no AM, aponta relatório

Manaus - Um relatório elaborado pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNCPCT), vinculado ao Governo Federal, divulgado em janeiro deste ano, constatou que são as facções criminosas que comandam as prisões, em Manaus, e produzem suas próprias leis. Apenas neste ano, quatro detentos foram mortos por outros presos nas cadeias do Estado. Além disso, foi constatado que os serviços prestados pelas empresas que coadministram os presídios são falhos.
De acordo com MNPCT, foi solicitado ao Ministério Público do Estado do Amazonas (MP-AM) que, em dois meses, fiscalizasse os contratos entre o governo do Estado e as empresas privadas para tentar extinguir essas e outras irregularidades encontradas. No entanto, até a última quinta-feira, nenhuma informação foi encaminhada pelo MP ao mecanismo, segundo informou a coordenadora do MNPCT, Thais Lemos Duarte.
Conforme o documento, as visitas não agendadas foram realizadas, entre os dias 7 e 11 de dezembro de 2015, por quatro peritas do MCPCT. As unidades prisionais visitadas foram o Centro de Detenção Provisória de Manaus (CDPM), a Cadeia Pública Desembargador Raimundo Vidal Pessoa (CPDRVP), o regime fechado do Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj) e a Penitenciária Feminina de Manaus (PFM). 
No relatório, as peritas justificaram que as penitenciárias foram escolhidas por conta dos indícios de irregularidades. “O MNPCT decidiu visitar especificamente as unidades listadas em decorrência de denúncias coletadas sobre estes locais, algumas com claros indícios de tortura e maus-tratos; por notícias de óbitos e a fragilidade do direito à vida nas unidades”. O  MNPCT é vinculado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR).
No Centro de Detenção Provisória Masculino (CDPM), por exemplo, foi constatado que, em quatro pavilhões, estavam os presos vinculados à facção Família do Norte (FDN). Já no prédio identificado como anexo inferior, ficavam os policiais militares e civis, outros servidores públicos e detentos com nível financeiro mais alto. “As pessoas do Anexo Superior, por sua vez, são ligadas ao Primeiro Comando da Capital (PCC)...”, consta.
A atuação dos agentes carcerários, como foi identificada durante a visita, se restringe à abertura e fechamento de celas, movimentação de presos em alguns espaços da unidade e outras atividades pontuais. Nos demais casos, a realização das atividades fica sob a responsabilidade dos presos. “Em vista disso, os presos podem ser extorquidos, ameaçados e, inclusive, mortos pelos demais detentos. Por estar ausente, o Estado dificilmente conseguirá averiguar tais fatos devidamente”.

Fiscalização de contratos
Diante do relatório, foi recomendado ao Ministério Público do Estado do Amazonas (MP-AM) que, de forma imediata, sejam fiscalizados os contratos celebrados entre o governo e as empresas Umanizzare e RH Multi Serviços na cogestão de unidades prisionais.
Em nota, o MP-AM informou que, até o momento, a Coordenação de Apoio Operacional e Defesa dos Direitos Constitucionais do Cidadão (CAO-PDC) não havia recebido recomendação oficial referente ao relatório nacional.
No entanto, o MNPCT informou ter enviado, no dia 14 de janeiro, uma cópia do relatório a vários órgãos do Estado do Amazonas, dentro eles, o Ministério Público. Mas, até o momento, não obteve informações sobre a recomendação proferida pelo MNPCT de fiscalização, por parte do Ministério Público Estadual, quanto aos contratos.
A Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) também informou que teve acesso ao relatório, no último dia 18, e que o documento está sendo estudado para que sejam adotadas as devidas providências, caso procedam. Ressalta, também, que as visitas periciais às unidades foram realizadas no início de dezembro e que, desde então, duas das quatro unidades passaram por reformas administrativas, inclusive, na gestão prisional.

Conforme o titular da Seap, Pedro Florêncio, o órgão não tem como impedir os chamados ‘tribunais do crime’, em que os próprios ‘xerifes’ julgam e punem os detentos, mas, segundo ele, não haverá impunidade. “Todos que estão cometendo crimes dentro das cadeias estão sendo punidos”, disse o secretário. Conforme a Seap, em 2015, 26 detentos morreram em unidades prisionais.
Texto: Carla Albuquerque e Thiago Monteiro

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