terça-feira, 17 de março de 2015

População mata o segundo acusado de estuprar a mulher na frente do marido em Zé Doca

Foi morto por populares o segundo acusado de participar do estupro da mulher em frente ao marido no povoado Ebenezia, zona rural de Zé Doca, estado do Maranhão. Segundo as informações, a população localizou o acusado em um matagal distante a 2 km do povoado Quadro.
O acusado identificado como Samuel Roseno Ferreira, aproximadamente 27 anos, foi linchado pela população. O mesmo foi morto a facadas e a tiros. 
O acusado também estava em companhia de Emanuel Feitosa que foi amarrado e levado para o povoado Ebenezia e em seguida foi entregue para a polícia. Segundo as informações, Emanuel não teve participação no estupro da mulher e disse que teria fugido por medo de também ser linchado.
Segundo Emanuel Feitosa que está preso, disse que tanto ele, como também o acusado Samuel Roseno residiam na cidade de Bom Jardim.
De acordo com as informações, cerca de 200 homens estavam à procura do elemento desde a noite de domingo quando ocorreu o crime no povoado. Nesta mesma noite, a população também linchou o outro acusado de participar do estupro Gildenir Souza Patrício.
Os dois elementos linchados estupraram a mulher na frente do marido, enquanto ele era mantido amarrado. Enquanto a mulher era abusada sexualmente, o marido da vítima era espancado por um dos elementos.

É MUITA BURRICE PEDIR DITADURA PARA O BRASIL

Quando escuto brasileiros fazendo manifestação pela volta da ditadura, penso que eles não podem saber o que estão dizendo. Quem sabe, não diz. Mas esse primeiro pensamento é uma mistura de arrogância e de ingenuidade. O mais provável é que uma parte significativa desses homens e mulheres que têm se manifestado nas ruas desde o final das eleições, orgulhosos de sua falta de pudor, peçam a volta dos militares ao poder exatamente porque sabem o que dizem. Mas talvez seja preciso manter não a arrogância, mas a ingenuidade de acreditar que não sabem, porque quem sabe não diria, não poderia dizer. Não seria capaz, não ousaria. É para estes, os que desconhecem o seu dizer, estes, que talvez nem existam, que amplio aqui a voz das crianças torturadas, de várias maneiras, pela ditadura.
Crianças. Torturadas. De várias maneiras.
Botavam meu pai no pau de arara e, para o fazerem falar, simulavam me torturar com uma corda. Eu tinha dois anos
Como Ernesto Carlos Dias do Nascimento. Ele tinha dois anos e três meses. Foi considerado terrorista, “Elemento Menor Subversivo”, banido do país por decreto presidencial. Foi preso em 18 de maio de 1970, em São Paulo, com sua mãe, Jovelina Tonello do Nascimento. O pai, Manoel Dias do Nascimento, militante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), organização comandada por Carlos Lamarca, havia sido preso horas antes. Ernesto é quem conta:
“Me levaram diversas vezes às sessões de tortura para ver meu pai preso no pau de arara. Para o fazerem falar, simulavam me torturar, com uma corda, na sala ao lado, separados apenas por um biombo”.
O menino de dois anos dizia: “Não pode bater no papai. Não pode”.
E batiam.
Libertado quase um mês depois, passou os primeiros anos com pavor de policiais de farda e grupos com mais de quatro pessoas. Entrava em pânico, escondia-se debaixo da cama ou dentro do armário, mordia quem se aproximava e urinava nas calças. Ernesto foi uma criança com pesadelos recorrentes. O mais comum era com um asno, uma corda e uma agulha. “O asno usava um boné militar, a agulha tinha olhos arregalados e uma risada aguda sarcástica e corria atrás de mim, eu apavorado tentava fugir. O asno me cercava, me dava coices ou chutava coisas sobre mim. A corda parecia boazinha, disfarçada de linha se estendia até mim, mas quando eu a segurava ela  machucava minhas mãos e me deixava cair em um abismo.”
Perto do parto, o líquido amniótico descia pelas minhas pernas e as baratas me atacavam em bandos. Eu gritava na cela”
Ernesto é um dos 44 adultos torturados na infância – física e psicologicamente, mas também de outras maneiras – que contam sua história em um livro lançado em novembro pela Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”. Infância roubada – crianças atingidas pela Ditadura Militar no Brasil é a memória do inominável que precisa ser nomeado para que cada um deles possa viver, para que o crime de Estado não se repita. A maioria dos depoimentos foi registrada em audiências na Comissão da Verdade de São Paulo. Algumas pessoas, que não puderam comparecer ou não conseguiam falar sobre o assunto, foram entrevistadas depois.
O que dizer sobre crianças torturadas pelo Estado? E torturadas ontem, em parâmetros históricos, bem aqui? Os relatos desse livro são alheios aos adjetivos. São silêncios que falam. E soluçam. Como João Carlos Schmidt de Almeida Grabois, o Joca, antes mesmo de nascer. Ele estava na barriga da mãe, Crimeia, quando ela levou choques elétricos, foi espancada em diversas partes do corpo e agredida a socos no rosto. Enquanto ela era assim brutalizada, os agentes da repressão ameaçavam sequestrar seu bebê tão logo nascesse. Quando os carcereiros pegavam as chaves para abrir a porta da cela e levar Crimeia à sala de tortura, o bebê começou a soluçar dentro da barriga. Joca nasceu na prisão e, anos depois, já crescido, quando ouvia o barulho de chaves, voltava a soluçar. A marca da ditadura nele é um soluço.
Torturado por agentes da repressão ainda bebê, ele nunca se libertou do pavor. Suicidou-se aos 40 anos
Perto da hora do parto, em vez de levarem Crimeia para a enfermaria, a colocaram numa cela cheia de baratas. Como o líquido amniótico escorria pelas pernas, elas a atacavam em bandos. Isso durou quase um dia inteiro. Só no fim da tarde, com outros presos gritando junto com ela, a levaram para o hospital. O obstetra disse que, como não estava de plantão, só faria a cesariana no dia seguinte. Crimeia alertou que seu filho poderia morrer. O médico respondeu: “É melhor! Um comunista a menos”. O pai de Joca foi assassinado pelo regime militar meses depois de o menino nascer. A primeira vez que ele viu o rosto do pai foi aos 18 anos, numa foto nos arquivos do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) de São Paulo.
Carlos Alexandre Azevedo, o Cacá, não suportou a lembrança. Talvez porque ele nunca pôde transformá-la em memória. Era nele algo vivo e sem palavras, um silêncio que não conseguia se dizer. E um silêncio que não consegue se dizer é um pavor. Ele tinha um ano e oito meses quando sua casa foi invadida por policiais do DOPS/SP, em janeiro de 1974. Como começou a chorar, os policiais deram-lhe um soco na boca que de imediato sangrou. Passou mais de 15 horas em poder da repressão, nas mãos de funcionários do Estado, enquanto lá fora gente demais vivia suas vidas fingindo que nada acontecia. Seus pais ouviram relatos de que nesse período o menino, pouco mais que um bebê, teria levado choques elétricos. Cacá se matou aos 40 anos, em 2013. Seu pai diria: “Ele ficou apavorado. E esse pavor tomou conta dele. Entendo que a morte dele foi o limite da angústia”.
Testemunhei o assassinato do meu pai. Não posso nem quero esquecer, porque
a única lembrança que tenho dele é a da sua morte
Ângela Telma de Oliveira Lucena escolheu lembrar. Tinha três anos e meio quando executaram o pai diante dela. Ângela diz:
“Eu lembro como ele estava vestido. Eu lembro exatamente como tudo se desenrolou naquele dia. Eu estava no colo da minha mãe, e quando fui crescendo, durante muitos anos ficava pensando se tinha sonhado aquilo ou se era realmente um fato que tinha ocorrido. Eu vivia um conflito entre apagar, riscar aquilo da minha vida, mas, ao mesmo tempo, sabia que, se fizesse isso, estaria riscando a história da minha família. (...) As pessoas sempre colocam em dúvida se eu realmente consigo lembrar da morte do meu pai. (...) Eu gostaria muito de poder apagar esse momento do assassinato do meu pai da minha vida. Mas eu não posso, eu não quero e eu não consigo. Porque a única memória que tenho do meu pai é exatamente o momento da sua morte”.
Houve Paulo Fonteles Filho, cujo parto da mãe foi uma tortura iniciada por policiais, completada pelo médico. Aos cinco meses de gestação, Hecilda era espancada com socos e pontapés, aos gritos de: “Filho dessa raça não deve nascer”. Era mantida acordada a noite inteira com uma luz forte no rosto, no que se chamava de “tortura dos refletores”. Depois, sentada numa cadeira, os fios subiam pelas pernas e eram amarrados nos seios, causando calor, frio, asfixia. Mais tarde, foi colocada numa cela cheia de baratas. Ela já não conseguia ficar nem em pé nem sentada. Como não tinha colchão, deitou-se no chão. As baratas começaram a roê-la. Ela só conseguiu tirar o sutiã e tapar a boca e os ouvidos. Levaram-na então para o Hospital da Guarnição do Exército, em Brasília. Ela lembra da irritação extrema do médico, que induziu o parto e fez o corte sem anestesia. Hecilda não chorou. Ela conta no livro Luta, Substantivo Feminino: Mulheres Torturadas, desaparecidas e mortas na resistência à ditadura, publicado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos: “Depois disso ficavam dizendo que eu era fria, sem emoção, sem sentimentos. Todos queriam ver quem era a ‘fera’ que estava ali”. Assim é contado o nascimento de Paulo, assim é como ele começa a se contar. Nascido entre feras – nenhuma delas a sua mãe. Nascido entre humanos, os mais brutais entre as feras.
E houve as crianças que não nasceram, porque suas mães abortaram durante a tortura
E há aqueles que não nasceram. Como o filho de Isabel Fávero que, aos dois meses de gravidez foi colocada numa sala e torturada com choques, pau de arara, ameaça de estupro e insultos verbais. No quinto dia, abortou. Isabel foi trancada num quarto fechado, onde ficou incomunicável. Ou Nádia Lucia do Nascimento, grávida de seis meses, colocada na temida “cadeira do dragão”. Depois de ter a roupa arrancada, levou choques elétricos por todo o corpo. Abortou. Teve hemorragias e dores, nenhum atendimento médico.
Essa é a memória das crianças da ditadura. É a lembrança de parto de suas mães. Nós, que não fomos torturados, não temos como alcançar como é viver com essa marca – ou tentar fazer marca do que ainda é horror – num momento histórico em que – depois de tudo – alguns brasileiros perderam a vergonha de pedir a volta da ditadura. Podemos tentar nos colocar no lugar desses homens e mulheres, hoje adultos com seus próprios filhos, alguns já avós, nascidos ou presos nos porões em que seus pais foram torturados e alguns deles assassinados. É fundamental tentar vestir o outro, mas não alcançamos. Não há como alcançar. Como é passar pela Avenida Paulista, como aconteceu algumas vezes nas últimas semanas, ouvindo os gritos de gente – gente, certamente gente – gritando por intervenção militar e volta da ditadura. Como é?
De Grenaldo Mesut a ditadura subtraiu sua própria história
Entre as dezenas de relatos desse livro, há um que destoa. Este eu conheci de perto. Testemunhei. Ao contrário da maioria, Grenaldo Erdmundo da Silva Mesut não tinha lembrança da repressão. Sequer sabia o que era ditadura para além de um nome vago, uma história que não lhe dizia respeito. Alguns poderiam supor que talvez fosse melhor assim, mas isso é desconhecer o quanto a ausência da memória é brutal, um buraco que se pressente, mas não se sabe como apalpar.
Sobre ele, a jornalista Tatiana Merlino, que o escutou e assina a edição e a organização primorosa desse livro, diz: “A ditadura deixou inúmeras marcas nos filhos das vítimas; dos desaparecidos, assassinados, presos: desde nascimento na prisão, serem levados aos órgãos de repressão, clandestinidade, exílio, banimento, etc. Há histórias de horror, de crianças que viram os pais torturados, que foram sequestradas... Mas a história do Grenaldo me toca por uma brutalidade especial a qual ele foi submetido, que é o desaparecimento, o apagamento, promovido pela ditadura, da sua própria história. A ele foi negado até o direito de vivenciar a dor da verdade de ser filho de um assassinado pelo regime. Para além da subtração da vida, do corpo, a mentira, a subtração da verdade. Quais são os impactos desse crime na construção da identidade do Grenaldo? É essa lacuna, que são se pode mensurar, que me toca profundamente”.
Meu caminho se cruzou com o de Grenaldo de uma forma que só acontece na vida real. Se fosse ficção, a história seria considerada tão fantasiosa que soaria de má qualidade. Na campanha eleitoral de 2002, eu trabalhava na revista Época e minha atribuição era contar o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva pela sua trajetória pessoal e familiar. Fiz várias reportagens e, no início do seu mandato como presidente, escrevi sobre a morte de sua primeira mulher, Maria de Lourdes, num parto em que ela e o bebê perderam a vida. Era mais uma das dores de Lula, dono de uma biografia que continha o DNA do Brasil, país que naquele momento ele começava a governar com a promessa de mudar o destino dos mais pobres e estatísticas como as da mortalidade materna.
Durante a investigação jornalística, descobri uma curiosa coincidência. O médico que assinou o atestado de óbito de Maria de Lourdes era um dos legistas acusados de ter forjado laudos para a ditadura. Sérgio Belmiro Acquesta, absolvido pelo Conselho Regional de Medicina um ano antes de morrer, era então gerente do departamento médico da Villares, metalúrgica em que Lula trabalhava como operário, e também funcionário do Instituto Médico Legal de São Paulo. Numa das páginas da reportagem havia a foto de dois casos em que ele teria atuado para apagar a responsabilidade do regime militar. Um dos retratos, em tamanho 3X4, era de um marinheiro, Grenaldo de Jesus Silva, que em 1972 sequestrou sozinho um avião da Varig. Depois de ter liberado todos os passageiros e a maior parte da tripulação, ele foi detido, imobilizado e morto no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, aos 31 anos. No dia seguinte, jornais estamparam a versão do regime: “Encurralado, terrorista suicidou-se”.
Três décadas depois, minha reportagem de capa foi publicada e essa pequena foto, mais do que toda a história de Lula e Lourdes, moveu lembranças insepultas. Dias depois, um homem que se apresentou como ex-sargento especialista da Aeronáutica, José Barazal Alvarez, então com 63 anos, procurou a revista. Quando o sequestro acabou, ele tinha sido o encarregado de fazer o relatório e recolher os pertences do morto. Ao examinar o corpo de Grenaldo, contou ter encontrado no peito uma carta ensanguentada e um segundo tiro. Nessa espécie de carta testamento, Grenaldo contava as razões do sequestro para o filho e prometia buscar a família tão logo chegasse ao Uruguai. José manteve segredo do que viu por 30 anos, não mencionou nada nem mesmo à própria mulher. Mas era assombrado pela carta, porque sabia que em algum lugar havia um filho que nunca recebera a palavra do pai, um gesto que, por não ter se completado, teria de ter causado estrago. Era desse pesadelo que José queria se libertar quando conversamos pela primeira vez. Ao ver a foto do marinheiro “suicidado” na reportagem, ele decidiu buscar o filho sem pai – e a libertação.
Em um reportagem sobre a primeira mulher de Lula, o ex-militar reencontrou o rosto que o assombrava havia 30 anos, o filho a face desconhecida do próprio pai
Eu procurei o filho. Mas mesmo entre as organizações de mortos e desaparecidos políticos da ditadura, a trajetória, as circunstâncias e a intenção do marinheiro que sequestrou um avião tinha muitas lacunas. Grenaldo foi um dos 1.509 marinheiros expulsos em 1964 por se alinhar com o presidente João Goulart. Destes, 414 foram condenados à prisão. Grenaldo recebeu a pena mais alta: cinco anos e dois meses. Fugiu e iniciou uma vida na clandestinidade. Dele era tudo o que se sabia até ressurgir num avião da Varig.
Tentei vários caminhos para encontrar seu filho, não consegui. Quando o telefone da minha mesa na redação tocou, eu ainda o procurava, mas já tinha escassas esperanças. No outro lado, uma mulher me disse que o filho do marinheiro queria conversar comigo. As linhas finalmente se cruzavam e, por um breve instante, esqueci de respirar. O que tinha se passado era algo tão prosaico, um clichê. Uma mulher folheava distraída uma revista velha no consultório do dentista, quando se deparou com o nome bastante raro. De imediato ligou para a irmã: “Leila, tem um homem aqui com o mesmo nome do seu marido. Será que não é o pai dele?”.
O marido de Leila não falava do pai. Ele era sobrevivente de uma infância arruinada, na qual o legado do pai era um “sangue ruim”. Sua mãe nunca soube das ações políticas do marido e, quando ele sumiu e reapareceu na capa dos jornais como “terrorista”, ela não pôde entender. Mônica Mesut já conhecera o marido na clandestinidade, na cidade paulista de Guarulhos, sem jamais ter sido informada de que ele tivera outra vida. Enquanto esteve com ela, Grenaldo foi vigia da construtora Camargo Corrêa e teve pelo menos dois negócios fracassados. Em 1971, começou a receber cartas que o deixavam muito nervoso. Um dia saiu de casa prometendo voltar para dar a família uma vida melhor e só voltou a aparecer num avião da Varig. O filho tinha quatro anos.
Até a vida adulta, do pai ele só sabia que era “ladrão” e “terrorista”. A família era muito pobre, sem nenhuma formação política e precária educação. Grenaldo, o filho, cresceu num cenário em que tudo faltava, entre uma mãe alcoólatra, um tio violento e uma avó devastada. Christina, a avó, e Mônica, a mãe, já eram elas mesmas sobreviventes de uma outra guerra. Ao fugir da Alemanha depois da Segunda Guerra Mundial, Christina encontrou um bebê nos braços de uma mulher morta. Sem leite ou comida, rasgou o pulso e alimentou-o com sangue. Era Mônica, a mãe de Grenaldo, que em 1972 não suportou ver o marido e pai do seu filho como terrorista e suicida nas capas dos jornais. Acreditou na ditadura e na imprensa. Em uma família na qual o passado já era trevas, mais um apagamento fazia todo o sentido.
Quando Grenaldo ainda era criança, Mônica literalizou a destruição da memória ao sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) que a reduziu a quase nada. Morreria só anos depois. Enquanto viveu, Grenaldo e a mãe eram espancados primeiro pelo padrasto, depois pelo tio. O nome do pai só emergia pelo ódio, na boca de todos, por qualquer motivo e antes de cada surra: “Seu filho de ladrão!”. E então, quando ele tinha 35 anos, já professor de educação física e pai de família, apareceu aquele nome numa reportagem, com uma história diferente. Na mesma página de revista, José reencontrou o rosto que o assombrava, Grenaldo deparou-se com a face desconhecida do próprio pai.
O filho do marinheiro marcou um encontro comigo numa pizzaria de São Paulo. Eu carregava vários livros sobre a ditadura para dar a ele e um enorme temor. Como contar a um filho quem era seu pai? Como dar a um filho notícias do pai? Como se faz algo assim tão enorme, com que palavras? Me senti tão insuficiente. Cheguei mais cedo, como sempre faço, e esperei. Vi aquele homem enorme chegar, com o rosto transtornado por algo que era medo e era expectativa e era, me parecia, um pedido de compaixão. Era como se ele suplicasse com aqueles olhos arregalados, quase infantis, que eu tivesse cuidado, que eu possuía ali o poder de acabar com o delicado equilíbrio que ele havia alcançado com um esforço impossível de mensurar. Percebi que ele não tinha a menor ideia do que ia ouvir. Naquele momento, Grenaldo começou uma travessia em busca de um pai e de um país. Os dois, ao mesmo tempo. E eu era a ponte imperfeita e aquém diante dele. Quando voltei desse encontro, lembro de ter deitado na cama de roupa e ficado ali de olhos estalados até o dia amanhecer, porque era tão grande aquilo, grande demais.
Grenaldo iniciou, aos 35 anos, uma travessia em busca do pai – e do país
Dias depois, marquei um encontro entre Grenaldo, o filho, e José, o ex-militar. A cena era impressionante. Grenaldo caiu de joelhos diante de José. E José libertou-se de um pesadelo de 30 anos. Todos naquela sala choravam. Naquele momento, a vida não cabia em nós.
José encerrava ali três décadas de um pesadelo recorrente, o de um homem assassinado, amontoado como um saco de lixo, num Opala preto da repressão. E Grenaldo iniciava uma série de noites agitadas, em que sonhava ser um detetive em busca de pistas.
Com a ajuda de um advogado, Grenaldo e eu passamos semanas, meses, buscando a carta que era sua. Numa noite, lembro de outra cena: as fotos do inquérito militar espalhadas pelo chão da sala da casa de Grenaldo. As imagens do pai morto, sangue, e nós dois tentando desvendar aquele quebra-cabeça macabro. Eu pensava: como ele vai suportar esse destino transtornado de um dia para o outro?
Grenaldo tinha – tem – algo que poderia ser definido como uma pureza resistente, algo que ele manteve intacto mesmo no inferno que foi sua infância, algo que eu já vi em outros sobreviventes, e algo que naquele momento o salvava de novo. Consegui localizar a última pessoa a encontrar seu pai com vida no avião e provar que ele foi assassinado. Testemunhas lembravam do estranho caso do homem “suicidado com um tiro na nuca”. A granada que supostamente o marinheiro portava durante o sequestro era, segundo José, um carretel de pescaria enrolado com fita crepe.
Grenaldo, o pai, foi reconhecido como um dos executados pela ditadura, e o filho pôde receber uma indenização do Estado. Meses depois, ele reencontrou a avó paterna no Maranhão e resgatou os laços perdidos com uma família que não sabia que tinha. Ele soube então que, depois de deixar a casa de Guarulhos e antes de sequestrar o avião, o marinheiro perseguido pela repressão tinha visitado a mãe, para dar a notícia de que ela tinha um neto e lhe deixar uma foto do menino. Atrás do retrato estava escrito: “São três anos que completo, sou um meninão. Um dia vou crescer, visitar o Maranhão. Naldinho. 9/6/71”. Passaram-se mais de três décadas até ele desembarcar no aeroporto de São Luís, onde a avó o esperava. Viveram uma relação de afeto pungente até a morte dela.
Nunca conseguimos encontrar a carta, e o gesto do pai jamais será completado. É enorme a tragédia de uma carta que não encontra seu destinatário. Essa letra perdida será sempre um buraco que Grenaldo terá de sustentar, mas um buraco que ele vai preenchendo com a construção da memória. Hoje ele tem um pai – e tem um país. E é com os pedaços faltantes de ambos que precisa lidar. Grenaldo se prepara agora para contar para sua filha mais velha a história do avô. E às vezes, quando um dos dois filhos diz que não consegue fazer alguma coisa, ele diz: “Não fale que você não consegue, essa palavra não pode existir. Você é neto do Grenaldo!”.
Não sei quem são os brasileiros que gritam nas ruas pedindo a volta da ditadura. Desconheço as pessoas que clamam por intervenção militar como se isso não fosse uma vergonha, uma indignidade, e sim a prerrogativa de “cidadãos de bem”. Acho que nunca tive tanto medo desse deformado discurso “do bem” quanto hoje, essa época em que todo o pudor foi perdido e a ignorância da História é ostentada como um troféu. Sei que são pessoas, porque só humanos são capazes de algo tão brutal.
Dizem que eram “apenas” 400 no primeiro sábado de dezembro, em São Paulo. Alegam que 400 pedindo intervenção militar é pouco. Eu digo que um é muito. Respeito o direito que têm de se expressar, porque ao fazê-lo reforçam a expressão máxima da democracia, na grandeza de acolher a voz até mesmo de quem exige o seu fim. Mas me reservo o direito de, por um momento, escolher a ingenuidade. Prefiro acreditar que vocês não sabem do que falam nem o que pedem. Não podem saber. Se soubessem, não ousariam.
Eliane Brum é escritora, repórter e documentarista. Autora dos livros de não ficçãoColuna Prestes - o Avesso da Lenda, A Vida Que Ninguém vê, O Olho da Rua, A Menina Quebrada, Meus Desacontecimentos e do romance Uma Duas. Site: elianebrum.com Email: elianebrum.coluna@gmail.com Twitter: @brumelianebrum

PREFEITO DE CALDAS NOVAS TENTANDO INTIMIDAR ROBSON MAIA COM PROCESSO

Obs.: Válido apenas como consulta  Este substitui o extrato do Telejudiciário

Juiz do Trabalho afastado por corrupção lidera movimento pelo impeachmant em Rondônia

O que tinha de corruptos protestando contra Dilma no dia 15 de março, não está escrito nos gibis. Tinha de jornalista estelionatário a juiz afastado por desviar bilhões do TRT de Rondônia. Começando por baixo, o jornalista Danny Bueno, que liderou o movimento “Revoltados On Line”, pró-impeachment de Dilma, já foi denunciado pelo MP por fraude, estelionato e falsificação de documentos. Ex-funcionário do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil do Estado de Rondônia (STICCERO), que se passava por jornalista profissional, Danny Bueno foi acusado pelo Ministério Público Federal e pelo Sindicato dos Jornalistas de Rondônia (SINJOR) por falsificação de diploma de jornalista.
A ação foi protocolada na Justiça Federal em 07/10/2010, sob o nº 14325-82.2010.4.01.4100, pelo MPF onde acusa Danny Bueno de Moraes de falsificar diploma de graduação no curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Estado do Mato Grosso (UFMT).

Juiz Domingos Sávio nos protestos


E quem também foi protestar contra a corrupção domingo foi o juiz trabalhista, Domingos Sávio Gomes dos Santos, afastado de suas funções pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) juntamente com o desembargador Vulmar de Araújo Coelho Júnior, suspeitos de envolvimento com esquema de fraude na administração e no pagamento de mais de R$ 1 bilhão de reais em precatórios.
A investigação da Corregedoria Nacional de Justiça descobriu que o juiz Domingos Sávio, quando estava à frente da 2ª Vara do Trabalho de Porto Velho, entregou boa parte dos precatórios ao Sintero e a seus advogados, que ficaram encarregados de repassar os valores financeiros a mais de quatro mil beneficiários.
Foi apurado que a prestação de contas era feita por meio de uma lista apresentada pelo sindicato, sem juntada do comprovante de depósito bancário em nome do titular do crédito nem do recibo assinado por este. A Corregedoria Nacional de Justiça descobriu que muitos credores, embora falecidos, continuavam figurando como destinatários dos pagamentos. Não foram habilitados herdeiros na reclamação trabalhista.
“Mesmo ciente disso, o juiz Domingos Sávio autorizou o levantamento de créditos na pessoa do presidente do sindicato ou de supostos procuradores, facilitando que terceiros tivessem a posse de valores que não lhes pertenciam”, escreveu o corregedor nacional de Justiça em seu voto.
Segundo o ministro, o desembargador Vulmar de Araújo Coelho Júnior e o juiz Domingos Sávio Gomes dos Santos fizeram ameaças e coações contra pelo menos quatro magistrados e uma servidora que seriam obstáculos aos intentos do grupo envolvido nas fraudes, que contava também com a participação de advogados das partes credoras dos precatórios.

Fonte: 
Redação - com informações do Mais Rondônia

Datafolha: 92% dos manifestantes em SP votaram em Aécio: Essa eu já sabia!

Protestar contra a corrupção foi a principal motivação das pessoas que resolveram ir à manifestação de domingo (15) em São Paulo, mostra pesquisa Datafolha feita durante o ato. Este motivo foi citado por quase metade dos entrevistados do instituto.
O pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff, usado por alguns dos grupos organizadores do ato, vem em segundo lugar. Foi mencionado por 27%. Protestar contra o PT (20%) e contra os políticos (14%) foram as outras razões mais citadas.
No universo dos 210 mil manifestantes que lotaram a av. Paulista no domingo na contagem do Datafolha, 92% declararam ter votado no tucano Aécio Neves no segundo turno da eleição presidencial de 2014, 37% manifestaram simpatia pelo PSDB e 74% participavam de protesto na rua pela primeira vez na vida.

Ladrão é preso após roubar e estuprar idosa de 69 anos

O desocupado W.S de 21 anos, que já possui várias passagens pela policia, foi preso  pela policia militar após roubar e estuprar uma idosa de 69 anos no Bairro do Porto Novo na região sul de Caraguatatuba. Além de cometer o roubo e estupro, o acusado fez uma família refém para tentar fugir dos policiais.


Tudo começou quando W.S. de 22 anos, pulou o muro de uma residência na Rua Cinco, no Porto Novo. Ao perceber a entrada do indivíduo, a senhora de 68 anos ligou para o 190 para informar a ocorrência. Ele conseguiu arrombar a porta da cozinha e depois do banheiro, onde a vítima estava escondida e praticou o estupro.

O criminoso exigiu da idosa dinheiro e jóias, mas fugiu sem levar nada ao perceber a chegada da polícia. No local, a policia encontrou uma faca de cozinha usada para a prática do crime. A idosa foi atendida na UPA, onde exames confirmaram o estupro.

O marginal para fugir da policia pulou várias casas, e cerca de 20 policiais realizaram um cerco para prendê-lo. Na Rua Seis, o homem entrou em outra casa e uma família foi mantida refém, dizendo que precisava de ajuda para fugir dos policiais. Ao serem informados por populares do seu paradeiro, os policiais militares localizaram o tarado em um terreno baldio próximo ao local. Questionado sobre o crime de estupro, o rapaz que já possui diversas passagens ironizou dizendo que o estupro não iria dar em nada para ele posteriormente na cadeia, pois lá conhece todo mundo.


O criminoso foi levado para a Delegacia de Polícia, onde permaneceu à disposição da justiça.

UM FINANCIADOR DA TORTURA - ASSIM FUNCIONA A DITADURA

Henning Albert Boilesen (Copenhague14 de fevereiro de 1916 - São Paulo15 de abril de1971) foi um empresário dinamarquês radicado no Brasil, presidente da Ultragás e fundador doCIEE - Centro de Integração Empresa Escola. Um dos principais financiadores da repressão governamental à luta armada durante aditadura militar brasileira, foi assassinado por militantes do Movimento Revolucionário Tiradentes (MRT) e da Ação Libertadora Nacional (ALN) em 15 de abril de 1971, na cidade de São Paulo.

Biografia

Imigrando para o Brasil na década de 1930, onde conseguiu sucesso nos negócios, Boilesen foi um empresário anticomunista ferrenho muito influente na indústria brasileira na época da ditadura militar, tendo em seu currículo a participação na fundação do CIEE - Centro de Integração Empresa Escola, a presidência da Ultragás e a presidência do Rotary além de amizades pessoais com integrantes do governo brasileiro como o ex-ministro da FazendaDelfim Neto, com quem ajudou a montar a parceria entre empresários e militares contra a guerrilha armada.
Foi um dos primeiros grandes empresários a financiar o aparato político-militar brasileiro, por meio da Operação Bandeirante (OBAN), que viria a ser o embrião do modus operandidos DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações-Coordenação de Defesa Interna).
Presidente do grupo Ultra, Boilesen foi executado a tiros por militantes de duas organizações de esquerda, na manhã de 15 de abril de 1971, na Alameda Casa Branca, onde, dois anos antes, Carlos Marighella foi morto pelo delegado Sérgio Fleury, nos Jardins, em São Paulo. Seus executores dizem que o escolheram como exemplo para um justiçamento, acusando-o de ajudar no financiamento da repressão e de assistir a sessões de tortura de presos políticos. Metralhado e agonizante, o tiro de misericórdia lhe foi dado por Carlos Eugênio Paz, o "Clemente", um dos comandantes das ações armadas da ALN – Aliança Libertadora Nacional.
O documentário Cidadão Boilesen, de Chaim Litewski, conta a história do empresário. O documentário afirma que Boilesen era um cidadão marcado pelas ambiguidades e paradoxos típicos dos seres humanos. O filme vai até a Dinamarca, visita os arquivos de histórico escolar da escola onde Boilesen estudou quando criança e adolescente no início do século passado; além de entrevistar amigos, colaboradores civis e militares do empresário, o filho mais velho deste, o cônsul americano em São Paulo à época dos acontecimentos e um dos militantes que participaram da morte de Boilesen. Contém ainda depoimentos de figuras como o ex-Presidente do Brasil Fernando Henrique Cardoso, o ex-governador de São PauloPaulo Egídio MartinsErasmo Dias e do cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, entre outros personagens importantes da época. O filme debate fartamente o hábito do empresário de assistir as sessões de tortura, confirmado por testemunhos de militares e militantes da época.

Acusado de estupra e matar a tia por estrangulamento é preso em Açailândia e levado para Imperratriz

A Policia Civil de Açailândia, estado do Maranhão, comandada pelo Delegado Regional Assis Ramos prendeu na manhã de segunda feira, Wanderson Salazar da Silva, 25 anos, o mesmo foi preso em em cumprimento ao Mandado de Prisão da Comarca de Imperatriz, o mesmo é acusado de ter estuprado e matado a própria tia Maria Madalena da Silva, por estrangulamento em Abril de 2013, crime ocorrido na Rua Rio Grande do Norte, Bairro Juçara.
Maria Madalena é bastante conhecida nos Bairro Juçara e Nova Imperatriz, a mesma trabalhava á mais de 25 anos como feirante, na época do crime o sobrinho chegou a ser ouvido pela Policia Civil duas vezes, dias depois fugiu na cidade, por volta das 20 horas de segunda feira Wanderson Salazar chegou a Imperatriz, ele negou que tenha praticado o crime, ele agora ficará preso na Regional de Segurança aguardando decisão da Justiça.

Novo titular de segurança de Alckmin foi advogado de 123 processos do PCC (Primeiro Comando da Capital)

O novo titular da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo aparece no Tribunal de Justiça do Estado como advogado em pelo menos 123 processos na área civil em favor da Transcooper, segundo informa o jornal O Estado de S. Paulo nesta sexta-feira (9).


A cooperativa atendida por Alexandre de Moraes - que tem como missão enfrentar uma das principais organizações criminosas do país, o PCC (Primeiro Comando da Capital) - é citada em um investigação que apura formação de quadrilha e lavagem de dinheiro do PCC. 


Segundo a reportagem, Moraes afirmou em nota que começou a advogar para a Transcooper em janeiro de 2011, mas não atuou na investigação por suposta relação com o PCC. "Não houve qualquer prestação de serviços advocatícios - nem pelo secretário nem pelos demais sócios - às pessoas citadas em possível envolvimento com o crime organizado, em 2014. O contrato se referia estritamente à pessoa jurídica da cooperativa." Até o dia 8 de janeiro, entretanto, Moraes permanecia no site do TJ como defensor da cooperativa, frisou o Estadão.


"Moraes comandava um dos mais famosos escritórios de advocacia em São Paulo. Entre seus clientes estão empreiteiras, associações e políticos. Ele também participou, entre 2007 e 2010, da gestão Gilberto Kassab (PSD) na Prefeitura, quando acumulou os cargos de presidente da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) e da São Paulo Transporte (SPTrans), além das Secretarias de Serviços e de Transportes", publicou o jornal.

"Em 2010, quando as investigações sobre a Transcooper tiveram início, Moura era diretor de uma das empresas citadas, a Happy Play. As outras eram a Himalaia e a Novo Horizonte. Na investigação, um dos endereços da Happy Play era o da garagem da Transcooper", acrescentou. O processo contra a empresa ainda está em andamento no Ministério Público.

Para assumir o comando da Pasta a pedido do governador Geraldo Alckmin (PSDB), Moraes afirma ter renunciado a todos os processos em que atuava e solicitou, no último dia 1, uma licença temporária de sua inscrição como advogado na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). 

Fonte: http://cinenegocioseimoveis.blogspot.com.br

A guerra, de outubro a março

Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:

Quatro meses e dez dias depois de vencer o segundo turno da eleição presidencial, o governo Dilma Rousseff continua nas cordas.

As mobilizações do dia 13 foram vitoriosas. Mostraram que o governo mantém a conexão com sua base de eleitores - ainda que ela tenha se fragilizado depois da posse, pelo anuncio de medidas que ou eram desnecessárias e, portanto, erradas, ou eram necessárias e corretas mas foram mal explicadas e incompreendidas, o que dá no mesmo, do ponto de vista da percepção política.

O tamanho dos protestos do dia 15 não precisa ser exagerado, mas foi enorme.

Um simples exercício de calculadora de celular, feito na minha frente por um jornalista com boa experiência em cobertura de movimentos populares, já mostrava que era matematicamente impossível acreditar que a mobilização da avenida Paulista, em São Paulo poderia ter alcançado um milhão de pessoas - como foi calculado pela Policia Militar e divulgado pela TV Globo.
A divulgação de um número exagerado ajuda, obviamente, a engordar artificialmente o apoio social dos adversários do governo, o que é sempre útil para quem deseja fortalecer a disposição de ir para a rua e ampliar a participação em novos protestos que sem dúvida virão.

Também se pode ressalvar os dados sobre o protesto na capital federal. A julgar pelos números do Globo, a mobilização com faixas de Fora Dilma, em Brasília, foi menor do que o protesto do Fora FHC, de 1999, quando chegou a 75.000 pessoas, segundo o jornal.

Seja como for, neste domingo o país assistiu a um protesto colossal, um dos maiores de sua historia. Sociologicamente falando, foi basicamente uma parcela de eleitores de Aécio Neves que foi para a rua. Eram cidadãos de classe média, em sua maioria. Os mais influentes do ponto de vista social social, econômico e cultural.

São cidadãos que têm uma mídia que expressa seus interesses, e acessam um Estado que, do ponto de vista histórico, sempre foi organizado para servi-los - uma das poucas exceções, nós sabemos, ocorreu nos 12 anos de governo Lula-Dilma.

É um exercício fútil perguntar o que essas milhares de pessoas queriam.

Muitos portavam faixas genéricas - como denuncia de corrupção, mais verbas para educação, etc - que servem para enfeitar a paisagem e acalmar consciências que preferem acreditar que não sabem o que está acontecendo. Fazem a alegria de comentaristas políticos que, interessados em apresentar uma visão favorável das manifestações, precisam lhes dar algum verniz de inocência cívica.

Na prática, elas querem o fim do governo Dilma, por qualquer via, qualquer oferta do cardápio. O impeachment é a a mais delicada e o golpe militar a mais grotesca.

É curioso reparar que faixas que propõem rupturas institucionais e ataques ao regime democrático puderam ser exibidas a luz do dia sem causar estorvo ou constrangimento. Cidadãos que professam convicções democráticas - sem dúvida, milhares podiam ser encontrados nos protestos - não deram sinal de que sentiram-se insultados ou sequer ofendidos por companhias ideológicas tão condenáveis.

A realidade é que protestos desse tamanho, com esse grau de articulação e especialmente com este conteúdo, não buscam reivindicações específicas. Buscam o poder, disputam o Estado.

Acham possível dispensar denúncias concretas capazes de comprometer a presidente num crime de responsabilidade, cometido durante o mandato - como define a Constituição para um processo de impeachment.

Não querem nem saber do calendário eleitoral, que faz parte das indispensáveis regras da nossa democracia, pela qual os presidentes são eleitos diretamente pelo povo, de quatro em quatro anos.

Trabalham num universo político paralelo, uma sombra. A constante referência à “intervenção militar” e outras variações anunciam abertamente uma tentativa de reverter o processo democrático. São um reflexo da influência política dos “velhos combatentes da ditadura” sobre as mobilizações de hoje no Brasil, processo que guarda semelhança com a atuação política dos oficiais italianos e alemães após a Primeira Guerra Mundial, cuja mobilização está na origem dos movimentos que deram a origem ao fascismo e mesmo ao nazismo na Europa, como observa o professor Jean Tuchard em sua “Histoire des Idees Politiques.”

O esforço para vestir os protestos com símbolos nacionais - a começar por camisas da seleção brasileira - envolve um tipo peculiar de nacionalismo, que pouco tem a ver com o legítimo sentimento de amor e defesa de um país, sua cultura e suas tradições.

Na mesma obra, o professor Jean Touchard mostra que o fascismo e mesmo o nazismo criaram um tipo peculiar de nacionalismo, “nacionalismo dos vencidos, dos humilhados.” Parece óbvio que, no caso brasileiro, esse nacionalismo dos vencidos, não envolve uma derrota militar, mas social, produzida por mudanças relativamente modestas, mas reais, nas prioridades do Estado brasileiro, e também política, pela formidável ampliação de direitos ocorridas nos últimos anos, o que sempre foi inaceitável para cidadãos que ontem, na Paulista, portavam a faixa: “Quero meu país de volta”.

Essas mobilizações pretendem, com a força do número, pressionar as instituições do Estado, já alinhadas abertamente contra Lula-Dilma - do ministério público ao Congresso, passando pelo Supremo e pela Polícia Federal - a ignorar regras formais e escrúpulos políticos para abandonar o governo a própria sorte.

Se o roteiro está traçado, nada garante que será cumprido. Falta combinar com Dilma-Lula.

As manifestações de ontem trouxeram de volta uma discussão entre dirigentes do PT e aliados do governo. Há quem acredite que um protesto tão gigantesco, da oposição, precisa ser respondido por uma manifestação de tamanho equivalente - se for possível - por parte do governo. Discordo.
A mobilização social, evidentemente, é necessária e deve ser fortalecida em toda democracia. A manifestação do dia 13 mostrou isso. Minha avaliação é que poderiam ter ocorrido atos mais significativos, pela composição política, se tivesse havido uma preocupação maior com a formação de uma frente única para enfrentar adversários que planejam golpear a democracia.

Passeatas maiores ou menores não podem esconder o essencial, porém: os governos são eleitos para governar, o que implica, essencialmente, em tomar medidas para o bem da população.

Este é seu papel essencial, sua razão de ser - o motivo pelo qual pedem votos para todos os cidadãos numa eleição. Aí está seu verdadeiro teste e a garantia de sobrevivência.

Não se conhece nenhum governo que tenha sobrevivido pela participação de um campeonato de passeatas e atos públicos.

O importante no momento reside na reconstrução de relações produtivas com os movimentos sociais, em especial com os trabalhadores.
Foi aí que os problemas do segundo mandato de Dilma começaram. E é aí que o futuro de seu governo irá se agravar ou se resolver. A Lula deve caber um papel cada vez mais importante, essencial.

Pacotes de medidas contra corrupção podem até ter sua utilidade, mas a necessária disputa sobre a Petrobras e a Lava-Jato não se resolve no terreno das medidas jurídicas. É uma questão de esclarecimento, de comunicação e disputa política. É preciso mostrar o que se passou na empresa, separando fatos e provas de mistificações e propaganda, como deixou claro José Sergio Gabrielli em seu esclarecedor depoimento a CPI.

Para quem avalia que este governo pode ser ruim, mas é muito melhor do que os outros que disputam seu lugar, a questão é agir rápido. Estamos falando de uma operação para permitir a direita recuperar o poder de Estado, que não foi capaz de conquistar legitimamente pelo voto. Seu objetivo é revogar, uma a uma, as conquistas dos últimos anos. Para usar uma expressão bastante comum nas narrativas sobre a Segunda Guerra Mundial, que jogaram um momento decisivo na história da humanidade, os protestos mostraram que “as tropas alemãs se aproximam de Moscou…”